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De quem é Igreja?


Com frequência pode-se perceber um aumento no descontentamento dos cristãos com as instituições religiosas cristãs. Não é difícil ouvir nos círculos de conversa uma profunda mágoa que alguns cristãos sentem daquilo que é denominado por eles mesmos como igreja. Até mesmo já existem “irmãos” especializados em criticar e divulgar as mais novas formas de descontentamento contra as instituições religiosas cristãs seja isso por meio de livros, blogs, e-mails, vídeos ou pregações; tais “irmãos” se demonstram prolíferos na arte de conduzir os cristãos à um caminho de ódio, indignação e amargura. Os neo-revolucionários eclesiásticos prometem aniquilar com os desapontamentos através de uma síntese entre teologia dialética e cultura pós-moderna, gerando assim, uma forma de igreja moderna adaptada aos seus frequentadores em tudo o que lhes apraz.

O problema principal desse esforço revolucionário, da parte de alguns “irmãos”, não está no fato de serem enérgicos na forma de denunciar todas as coisas que acontecem de errado na igreja, mas sim no alvo que escolheram como o centro da discussão. Sem questionamento algum a culpa pelos erros da igreja recai sobre a mesma, dessa forma a crítica se torna muito superficial e não nos ajuda a esclarecer os motivos que levam os cristãos à um descontentamento com as instituições religiosas cristãs e o mais importante não nos leva à possíveis soluções. Embora muito sensacionalismo tenha surgido devido o grande empenho que há em torno do tema, poucos melhoramentos surgiram quando analisamos a proporção entre crítica e a devida resposta. Parte disso deve-se ao fato de que o real problema não está na igreja, mas nos próprios cristãos, torna-se confortável ao crítico desassociar o pecado individual, juntamente com toda a relação que há entre graça divina e responsabilidade humana (Rm 6.14-23), e transportar a culpa da atual situação para uma instituição impessoal que não pode ser culpada de pecado.

O fato também é que o ser humano sempre tenta colocar a culpa sobre os outros e nunca quer assumir a responsabilidade pelos seus próprios atos, assim foi com o pecador Adão que se escondeu de Deus e quando achado colocou a sua própria culpa sobre a mulher (Gn 3.6-19). O caminho mais fácil nem sempre é o mais seguro, Jesus nos alerta que o caminho da perdição é muito mais fácil que o da salvação (Mt 7.13s), tornou-se fácil e agradável colocar a culpa sobre as instituições religiosas e poucos são aqueles que realmente proclamam que somos nós que devemos mudar. Nesse ponto a igreja é apenas algo tão descartável quanto um copo plástico, a igreja descartável tem as suas facilidades, pois os cristãos que brigaram por algum motivo não precisam perdoar uns aos outros é só escolher outra igreja. A palavra de Deus nem sempre é como mel em nossa boca, algumas vezes ela se torna indigesta e amarga para nos fazer cair na realidade de que devemos nos colocar sobre a vontade de Deus e não sobre a nossa própria vontade. Pedir perdão é para os corajosos e sair de fininho é para os covardes.

Numa sociedade do descartável não deve ser nenhuma surpresa que o conceito de “descartável” tenha sido transportado para a eclesiologia. Mas o que espanta é o esquecimento da parte dos cristãos de quem realmente é o Senhor da Igreja (Ef 5.23). Uma visão sociológica da igreja permite uma interpretação evolutiva e não criacionista da mesma, as consequências da visão evolucionista podem ser traduzidas em forma de rebelião entre o clero e os leigos. O problema estaria nas lideranças que suprimiriam as ovelhas causando uma série de problemas psicológicos e espirituais. Qual seria a solução? Dentro dessa visão sociológica (i.e socialista) a solução seria aniquilar quase todas as formas de governo eclesiástico e instaurar uma forma de anarquismo cristão que não traria nenhum problema relacionado ao autoritarismo eclesiástico. Existem alguns problemas com essa forma de visão o primeiro seria a própria forma de interpretação da igreja, pois ela seria apenas uma realidade humana mutável e hierárquica supressora. Já ao lermos o Novo Testamento nos deparamos com uma visão divina da igreja, sendo constituída pelo próprio Deus em Cristo para os salvos. Sendo assim, resolver os problemas da igreja não é algo tão fácil quanto fazer uma revolta anarquista contra o “sistema” estabelecido, antes de tudo, seria mais um exercício de transformação espiritual dos crentes.

“Problemas na igreja também significam problemas com Deus”, essa premissa é básica para o entendimento da atual situação. Porém, a visão sociológica da igreja tende a separar a relação pessoal que os cristãos têm com o seu Deus com as relações interpessoais na igreja. O apóstolo João faz uma ligação muito interessante entre a minha relação com Deus e a minha relação com o próximo quando escreve: “Quem diz que vive na luz e odeia o seu irmão está na escuridão até agora.”(NTLH – Jo 2.9) É impossível ter uma relação saudável com meus irmãos na fé se eu mesmo não tenho uma relação saudável com Deus. Os que fecham os olhos para o verdadeiro motivo de descontentamento dos cristãos, não podem dar soluções frutíferas para esses problemas, pois eles têm apenas mais um objeto descartável a ser oferecido aos cristãos desejosos de respostas e soluções. Fácil é oferecer um caminho descartável, porém duro é permanecer no caminho difícil que leva os cristãos a crescerem espiritualmente e aprenderem a perdoar, amar, doar, jejuar, interceder...

De quem é a igreja? A igreja é minha, pois eu faço parte dela e por isso eu devo zelar pela sua saúde espiritual. Soluções instantâneas não existem, o que existe é a perseverança dos que amam a Deus até que o Senhor da Igreja venha buscá-la e levá-la para os altos Céus. Não dê ouvidos aos que prometem soluções extraordinárias, pois mágica evangélica é heresia. Mas para aquele que tem a mente de Cristo tudo é possível!


“E não somente isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança;” (ARA – Rm 5.3)

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